Caro doutor presidente Defensor
Não calcula como a minha alma zoófila rejubilou ao saber da sua decisão de comprar a praça de touros de Viana do Castelo, para nesse decrépito antro de tortura instalar um centro de ciência viva. Que sábia medida! A ciência, caro doutor presidente, precisa de praças de touros como do pão para a boca. Se outros lhe seguirem as pisadas, havemos de ver como a ciência progride em Portugal!
Ainda não tinha digerido o contentamento, quando outro raio de felicidade me atingiu: a declaração de Viana como cidade anti-touradas. Que prestígio para a terra que o elegeu! E como os touros o vão recompensar! Já estou a vê-lo, doutor presidente, no meio duma manada, recebendo as córneas carícias dos boizinhos agradecidos.
Mas não é apenas por isso que lhe escrevo. Imagine, doutor presidente, que há uns dias fui em passeio ao Alentejo, eu e as minhas companheiras da associação Amigos da Bicheza. Fomos para os lados da barragem de Alqueva e passámos por uma aldeia chamada Amieira, não sei se conhece. Pois bem: não contente em ter uma praça de touros logo à entrada, a dita aldeia tem também uma enorme estátua representando uma pega de caras! Que descaramento! Mas o pior (prepare-se, doutor presidente), ainda não é isto. O pior é que a freguesia da Amieira tem como brasão um par de instrumentos de tortura, bandarilhas ou lá como lhes chamam. Pode conceber-se maior desaforo? Bem sei que fomos bem recebidas na aldeia, que as ruas são limpas e a gente é atenciosa. Mas isso deve ser para disfarçar, porque quando entram na praça de touros, devem transformar-se em vampiros sedentos de sangue. Doutor presidente Defensor: venha já à Amieira e compre não apenas a praça, mas a aldeia toda. Faça dela um centro de ciência, para o estudo da minhoca, do caracol ou doutro animalzinho qualquer. A bem da ciência! A bem da bicheza! Receba a admiração desta que se assina
Maria Estorninho Salamandra
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