terça-feira, 16 de março de 2010

Mexicanos em Portugal


Entre 1936 e 1944, as relações taurinas entre a Espanha e o México estiveram suspensas. Os toureiros mexicanos não podiam actuar em Espanha e os espanhóis no México. Ao que parece, a ruptura não foi mais do que uma reacção de algumas figuras do toureio do país vizinho, com Marcial Lalanda e Vitoriano de la Serna à cabeça, ao enorme interesse que o asteca Fermín Espinosa Armillita estava a despertar entre o público hispânico. Juan Belmonte, o Pasmo de Triana, chamou-lhe o «boicote do medo».
Enquanto aguardavam o fim da proibição, numerosos toureiros mexicanos radicaram-se em Portugal, em busca de oportunidades e de fama. Uns eram já figuras no México, como o já referido Armillita, Silvério Pérez, Luis Procuna ou Fermín Rivera; outros, pelo contrário, não passavam de ilustres desconhecidos.
Alguns matadores mexicanos tinham já obtido assinalável êxito em praças portuguesas na primeira metade da década de 30. Foi o caso de Luís Castro, El Soldado, que obtém clamorosos triunfos no Campo Pequeno. «Toda a gente sabia que numa corrida em que actuasse El Soldado veria tourear com emoção e fossem quais fossem as condições dos toiros, alguma coisa de bom lhe seria dado observar», escreveu Jaime Duarte de Almeida («Os Mexicanos em Portugal»). Na senda de El Soldado, os seus compatriotas Lorenzo Garza e Ricardo Torres deixaram também excelentes credenciais entre nós.
Uma segunda vaga de diestros astecas chega a Portugal em 1943. Conta o aficionado e ganadeiro Francisco Palha Botelho Neves que «um ‘taurino’ desembaraçado e esperto, de nome Júlio Ginja, concertou com a empresa do Campo Pequeno, então regida pelo cambista José Ricardo Domingues, a contratação em grupo de vários ‘espadas’ mexicanos». Ginja deslocou-se ao México e ali contratou, com a promessa dum mínimo «de uma ou duas corridas no Campo Pequeno», os espadas Felipe González, Antonio Rangel, Leopoldo Ramos, Arturo Álvarez Vizcaíno, Carlos Vera Cañitas e Gregório García. Como condição, impôs que «cada toureiro importasse consigo e em seu nome, para Portugal, um automóvel novo.»
Esta exigência tinha pouco de taurino, mas muito de prático. Viviam-se então os anos da II Guerra Mundial, e a importação de veículos era extremamente limitada. Graças à esperteza de Ginja, o parque automóvel português foi enriquecido com novos exemplares. O «aparecimento de viaturas de procedência americana em Lisboa – e sendo tais veículos automóveis de grande luxo – deu nas vistas e alcançaram tais carros valores verdadeiramente especulativos», acrescenta Botelho Neves.  Foi por isso que «se passaram a identificar os automóveis de luxo como ‘espadas’, adjectivo que se vem mantendo até aos dias de hoje.» («Novo Burladero», nº 40)
Do lote de mexicanos contratado por Ginja destacou-se Gregório García, que se estreou no Campo Pequeno em 20 de Junho de 1943, com João Núncio, Simão da Veiga e o diestro espanhol El Estudiante.
O mexicano foi o indiscutível triunfador e a grande surpresa da tarde. «Gregório não impressionou pela arte, nem pela técnica, nem pelo sabor», admite o crítico Solilóquio. «Mas desprendia-se dele um não sei quê, um sortilégio, mistura explosiva de destemor, arrogância e simpatia, que desde os primeiros instantes em que se abriu de capa prenderam as gentes, não mais as largaram.» («A Última Tarde»).
Em pouco tempo Gregório tornou-se um ídolo. «Os táxis, os telefones, o correio, o telégrafo, os grooms dos cafés e dos dancings, tudo se mexeu num ritmo acelerado durante a estadia de Gregório no nosso País. Era Gregório por toda a parte!...» O público feminino adorava o mexicano. «À saída da praça, as mulheres perdiam-se dos maridos na ânsia de ver e tocar aquele que vinha do desconhecido surpreender e desarrumar tudo» («Diamantino Vizeu: memórias de um toureiro»). Só outro matador mexicano conseguiu aproximar-se da popularidade de Gregório: Carlos Arruza, que com o seu estilo desembaraçado e comunicativo também triunfou em Portugal.

Um comentário:

Enrique Martín disse...

No sé si de alguna forma todavía sufrimos este síndrome en España, aunque ya no haya prohibiciones, pero como siempre, cualquier veto de este tipo sólo perjudica al aficionado que no puede disfrutar de los mejores de cada momento.
Un saludo desde Espanha