No final de cada temporada, ao fazer-se o balanço do ano taurino, surge ciclicamente a questão do estado do toureio a pé em Portugal. Aficionados e críticos ainda não totalmente rendidos à lide quadrúpede expressam a sua preocupação com o reduzido número de corridas mistas e com o pouco entusiasmo em redor da arte de Montes. E temem, ano após ano, pelo seu futuro entre nós. Como solução, há os que colocam a esperança no aparecimento de um super-toureiro, uma espécie de D. Sebastião vestido de seda e oiro, que faça renascer o interesse pela lide a pé nas arenas lusitanas. Outros, lembrando os tempos de Diamantino e Manuel dos Santos, sustentam que para garantir o ressurgimento da modalidade, nada como criar uma rivalidade entre toureiros.
Infelizmente, o mal é bem mais grave e não se resolve com messianismos. O problema do toureio a pé em Portugal é, antes de tudo, um problema de dignidade. Num país onde se lidam novilhos, porque a sorte de varas não é admitida; onde as defesas dos animais são ignobilmente despontadas; onde a morte é uma simulação; onde não se cortam troféus que traduzam com um mínimo de objectividade o que foi a lide, não pode haver uma Festa digna. Por muitos novilheiros interessantes que despontem, nunca poderão exercer a sua profissão em táurodromos portugueses, porque aquilo que neles se pratica é um triste arremedo do verdadeiro toureio. Noutros países há vida e morte em confronto; por cá existe uma performance, uma absurda simulação do teatro trágico e belo da Festa.
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