quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Sangue de Palha em terras mexicanas



O excelente blog mexicano La Aldea de Tauro -"Una mirada desde Aguascalientes, tierra de toros"- vem lembrar a importância da presença de um touro de Palha na ganadaria mãe da cabana brava asteca - a ganadaria de San Mateo. O touro em causa foi oferecido aos proprietários da ganadaria, os irmãos Antonio e Julián Llaguno, pelo célebre diestro espanhol Ricardo Torres Torres Bombita, em 1907. Era o sobrero de uma corrida realizada na Cidade do México, em 17 de Fevereiro de 1907, em que Antonio Fuentes e Bombita lidaram dois touros de San Diego de los Padres e quatro de Palha. Na corrida destacou-se o quinto touro, «um arrogantíssimo cárdeno», que tomou seis varas recarregando, derrubou por cinco vezes os picadores e matou um cavalo. Segundo o blog, o sobrero português, «de indubitável procedência vazqueña», agregou «uma percentagem de sangue brava de origem conhecida» às reses dos Llaguno, que estas de início não possuíam (http://laaldeadetauro.blogspot.com/)




segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Revista "La Lidia" digitalizada

A Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional de Espanha tem disponível, para consulta on-line, a colecção de "La Lidia", uma das mais importantes publicações taurinas de sempre. Popularizada pelas suas coloridas litografias, assinadas por artistas como Daniel Perea, José Chaves e Angel Lizcano, "La Lidia" começou a publicar-se em 1882. O título conheceu diferentes conteúdos (entre 1894 e 1895 foi uma publicação generalista) até renascer em 1914, como revista taurina profusamente ilustrada, característica que manteve até ao seu final, em 1927. Agora perpetuada através da digitalização, "La Lidia" é um manancial de preciosos informes sobre a história do toureio (http://hemerotecadigital.bne.es/cgi-bin/Pandora.exe).

domingo, 9 de novembro de 2008

Magnífico "Touro"


A RTP 1 teve o desassombro -porque é disso que se trata nos tempo que correm- de exibir, em horário nobre, um magnífico documentário sobre o touro e a Festa que lhe está associada.
Intitulado simplesmente "Touro", o documentário de Camilo Azevedo é um hino ao bos taurus. Imagens fabulosas de touros no campo, galgando chapadas verdejantes ou deitados à sombra protectora de ancestrais azinheiras, antes de mostrarem no redondel o seu tesouro oculto: a bravura. Camilo Azevedo, que contou com a assessoria técnica de Joaquim Grave, teve ainda a clarividência de ouvir os interlocutores certos, personagens de relevo no mundo que retrata, desde o matador El Cid ao estudioso Andrés Amorós, passando pelo filósofo Francis Wolff. A ensombrar a esplendorosa beleza das imagens, apenas o tristíssimo "tronco" português, onde os nobres animais são imobilizados para a embolação, e a dolorosa jornada destes para o matadouro...

sábado, 8 de novembro de 2008

O radialista que ficou mal na fotografia

A Rádio Cidade FM juntou-se a empresas como a Unicer e a Kodak na repulsa pelo espectáculo taurino. Uns quantos mails de alegados defensores dos animais bastaram para que o director de programas da estação se sentisse na obrigação de declarar que a sua rádio não apoia corridas de touros, nem tem com elas qualquer relação. Se quisermos ver as coisas ironicamente, diremos que o radialista se meteu na cerveja e ficou mal na fotografia...
Mas não tenhamos ilusões. Situações como esta irão repetir-se, e é bom que os aficionados se comecem a habituar a elas. Porque há empresas e empresas. Há as que têm uma cultura empresarial de longa data, respeitadora dos hábitos do país em que se inserem, e existem outras que apenas vêem números. Como tal, basta uma ligeira suspeita de que determinada conduta as pode levar a perder público, para que reneguem as maiores evidências. O que ontem foi branco, hoje pode ser preto...
A este tipo de gente, agrilhoada pelos princípios do politicamente correcto, pela cobardia e pela falta de coluna vertebral, é preciso falar na linguagem que entendem. Mostrar-lhes que não podem estar bem com Deus e com o Diabo, e que a hostilização da Festa Brava lhes pode acarretar prejuízos. Mas isso não se consegue através de vozes isoladas. É urgente que os aficionados falem a uma só voz, através de organizações que os representem e que, com argumentos sólidos, demonstrem que gostar de corridas de touros não é crime nem sinónimo de barbarismo.
A estratégia dos auto-proclamados defensores dos animais é clara: pretendem empurrar o toureio para um gueto, marginalizar os aficionados e crismá-los com o ferrete de retrógrados. Para os contrariar, é necessário salientar que a Festa, mais do que um espectáculo português, é um fenómeno de dimensões ibéricas e até mesmo europeias. Que é património cultural do Velho Continente, e não serão os interesses de alguns merceeiros acobardados que a extinguirão.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Um problema de dignidade


No final de cada temporada, ao fazer-se o balanço do ano taurino, surge ciclicamente a questão do estado do toureio a pé em Portugal. Aficionados e críticos ainda não totalmente rendidos à lide quadrúpede expressam a sua preocupação com o reduzido número de corridas mistas e com o pouco entusiasmo em redor da arte de Montes. E temem, ano após ano, pelo seu futuro entre nós. Como solução, há os que colocam a esperança no aparecimento de um super-toureiro, uma espécie de D. Sebastião vestido de seda e oiro, que faça renascer o interesse pela lide a pé nas arenas lusitanas. Outros, lembrando os tempos de Diamantino e Manuel dos Santos, sustentam que para garantir o ressurgimento da modalidade, nada como criar uma rivalidade entre toureiros.
Infelizmente, o mal é bem mais grave e não se resolve com messianismos. O problema do toureio a pé em Portugal é, antes de tudo, um problema de dignidade. Num país onde se lidam novilhos, porque a sorte de varas não é admitida; onde as defesas dos animais são ignobilmente despontadas; onde a morte é uma simulação; onde não se cortam troféus que traduzam com um mínimo de objectividade o que foi a lide, não pode haver uma Festa digna. Por muitos novilheiros interessantes que despontem, nunca poderão exercer a sua profissão em táurodromos portugueses, porque aquilo que neles se pratica é um triste arremedo do verdadeiro toureio. Noutros países há vida e morte em confronto; por cá existe uma performance, uma absurda simulação do teatro trágico e belo da Festa.


segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Farto de tanta «dinastia»...

Uma onda de pirismo, de pretensiosismo saloio e aristocratismo de pechisbeque está a varrer a Festa em Portugal. Refiro-me à moda das «dinastias». Durante algum tempo, só se falou em cavaleiros de «dinastia»: os Telles, o Lupi, os Moura. Agora, o fenómeno chegou aos forcados, com o anúncio de uma tourada em Évora, em que são anunciados forcados de «dinastia». Serão mais que os outros? Teremos qualquer dia a Festa reduzida a um espectáculo de castas, de clãs, de «dinastias»? Perante tanta vénia e pergaminho duvidoso, apetece contar uma «estória» de Mestre Baptista. Toureava certo dia o cavaleiro de S. Marcos do Campo com Manuel Conde e Zoio, que nos seus primeiros tempos se fazia anunciar nos cartazes como D. José João Zoio. Chegado à praça, Baptista juntou-se aos colegas no pátio dos cavaleiros e, com o seu sorriso mais plebeu, disparou: «Há lugar para mais um fidalgo?»

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A verdade natural


Ao género humano custa aperceber-se das evidências. Quase sempre, é o que está mais próximo de nós que se vê mal ou nem sequer se vislumbra. A propósito da corrida em Vila Franca que juntou os matadores Luis Miguel Encabo, Salvador Cortés e António João Ferreira, e em resposta às inanidades que alguém escreveu sobre o festejo, o blog tauromaquianaturales.blogspot põe o dedo na ferida. E recorda que para o toureio a pé a sorte de varas é indispensável. Lidar sem varas touros de 4 anos ou novilhos quase touros, é meio caminho para o desastre. E onde está o problema? Responde Emílio Franco: o problema está que em Portugal ninguém luta por recuperar a sorte de varas. E sem ela o toureio a pé está inquestionavelmente falseado. Esta a verdade natural, em boa hora recordada.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Link do dia

A Universidade Autónoma de Ciudad Juárez (México) disponibiliza no seu site uma magnífica colecção de bilhetes postais antigos, trezentos dos quais são de tema taurino. Os amadores da cartofilia ou os simples aficionados podem ver as grandes figuras do toureio retratadas em praças mexicanas, de Rodolfo Gaona a Chicuelo, de Belmonte a Manolete.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Bibliotaurus (1)


A biografia é um dos géneros desde sempre privilegiados pela literatura de tema tauromáquico. Raro é o toureiro de fama cujos trabalhos e dias não foram contados, com maior ou menor fortuna, em letra impressa. Uma das melhores obras do género é «Juan Belmonte, matador de toros», do jornalista sevilhano Manuel Chaves Nogales (1897-1944).
Como realça a também jornalista Josefina Carabias no interessante epílogo à obra, Chaves Nogales não era aficionado, nem mostrava o menor interesse pela vida taurina. Resolveu escrever sobre Belmonte levado apenas «por el interés que despierta siempre en el escritor un tipo humano de carácter excepcional.»
A história é contada na primeira pessoa, mas por detrás do monólogo belmontino está Chaves Nogales e a limpidez da sua linguagem. De acordo com Josefina Carabias, não há nela «exageraciones, ditirambos, tecnicismos ni latiguillos». Daqui resulta a legibilidade das suas páginas, que a torna acessível a todos. Não é preciso ser-se aficionado de solera, nem conhecer a fundo o argot taurino para saborear o trabalho de Chaves Nogales como quem saboreia uma excelsa faena.
Pelas páginas do livro, publicado em 1935, perpassa um Belmonte de coração aberto, que recorda o seu debute em Elvas, numa quadrilha de niños sevillanos, as inúmeras dificuldades para impor o seu original toureio, o convívio com os intelectuais seus partidários e por fim o triunfo – ensombrecido pela trágica morte de Joselito, o rival com quem viveu aquela a que chamaram a Idade de Ouro do toureio.
(«Juan Belmonte, matador de toros», Alianza Editorial, Madrid, 2003)

Palmas para quê?


O pesadelo começa aos primeiros acordes do pasodoble. O casal-que-foi-aos-toiros-porque-está-lá-o-social, a jovem turista japonesa, o provecto turista americano, alçam as mãozinhas e vá de bater palmas a compasso. Pavlov teria aqui muito que estudar. É assim nos circos, quando toda a companhia desfila ao som da orquestra, ou quando os palhaços pedem às crianças que batam palminhas. O fenómeno tem nome: infantilização, mau gosto, ignorância. Por mim, se fosse cavalo ou toiro, enchia a arena de cheirosa matéria orgânica, como forma de protesto. Se fosse empresário, faria o inverso do que se faz em concursos e talk-shows televisivos. Em vez de pôr um sujeito a mandar o público bater palmas, poria um com um cartaz que rezaria: não bater palminhas enquanto a música toca. Tenho esperança que um dia destes um toureiro levante a mão e peça ao maestro para calar a fanfarra, e com ela o enervante palmejar. Como fazem os matadores-que-matam-mesmo, quando pedem à banda que suspenda a música no momento da estocada. Mas estamos em Portugal. Aqui não se afere o êxito dos artistas pelas orelhas que cortam, mas pelas voltas ao redondel ou pela musiquinha que soa ou não soa. Quem manda é o Paquito Chocolatero... Ou o Nerva, que sempre é menos kitsch.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Olhar e só ver cavalos


O novilheiro português Daniel Nunes, da escola da Golegã, cortou uma merecidíssima orelha na feira espanhola de Moralzarzal, facto destacado pela imprensa on-line do país vizinho. Lê-se, por exemplo em http://www.burladero.com/: «Lo más destacado ha sido la actuación del portugués, tanto con un complicado tercero, que puso en muchos apuros a la cuadrilla, al que toreó con muchísima tranquilidad en una labor de mucho valor y mérito, sacando algún muletazo bueno.» Em contrapartida, abrem-se os sites taurinos portugueses e sobre Daniel Nunes nada de nada. Em contrapartida, ficamos a saber que um cavaleiro de quinta categoria deu duas voltas à arena de Arrifana do Meio.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Nuas, nem vê-las...




Até há pouco tempo, os aficionados portugueses que quisessem admirar toiros na sua beleza íntegra, tinham um caminho: procurá-los onde os criam, isto é, no campo. Isto porque nas nossas praças só se podem ver toiros com as hastes «ensacadas» (não vá alguém assustar-se com as imponentes armas de alguns deles...) ou com elas «barbeadas», para não fazerem buracos onde não devem. Agora, chegou a moda de embolar os pitones no próprio campo, para que os animais não os danifiquem. O sofisticado sistema de embolação inclui ligaduras adesivas, cartuchos, fibra de vidro e resina. Em Espanha, o pioneiro foi o ganadeiro de Fuente Ymbro, Ricardo Gallardo; por cá, já se faz o mesmo na ganadaria de Ortigão Costa. Que tal se pratique no país vizinho, até se admite. Lá, com excepção das reses destinadas ao rejoneo, os toiros são lidados como manda a natureza. Em Portugal, pelo contrário, com a praga do toiro embolado ou despontado, hastes íntegras e nuas nem vê-las...

«El número uno» em livro


O catedrático e ensaísta espanhol Andrés Amorós lançou recentemente uma biografia do célebre matador Luis Miguel Dominguín. Amorós, que conheceu o seu biografado quando tinha cinco anos, oferece-nos um perfil não apenas toureiro mas também humano de Dominguín. Dele afirma, por exemplo, que «forjou uma fama de pessoa arrogante e antipática», mas que para os amigos era inexcedível. «Dele digo sempre que era bom amigo, mau inimigo e pior esposo», sublinha Amorós. «Luís Miguel Dominguín - El Número Uno» tem chancela da editora Casa de los Libros.

Em defesa da Festa


As diatribes anti-taurinas que nos últimos tempos se têm feito ouvir não são de todo inúteis. Elas tiveram, pelo menos, o mérito de revelar novos defensores do fenómeno tauromáquico, que vão para além do argumento da «tradição» e esgrimem com outras armas. Refiram-se os nomes do prestigiado filósofo francês Francis Wolff, que no seu livro «Filosofia de las Corridas de Toros», publicado em Espanha pelas Edicions Bellaterra, procede a uma fundamentada defesa da Festa. Afirma Wolff: «La corrida no es ni inmoral ni amoral en relación con las especies animales. La relación del hombre con los toros durante su vida y su último combate es desde muchos puntos de vista ejemplo de una ética general. (...) En la corrida el toro muere necesariamente, pero no es abatido como en el matadero, es combatido. Porque el combate en el ruedo, aunque sea fundamentalmente desigual, es radicalmente leal. El toro no es tratado como una bestia nociva que podemos exterminar ni como el chivo expiatorio que tenemos que sacrificar, sino como una especie combatiente que el hombre puede afrontar. Tiene, pues, que ser con el respeto de sus armas naturales, tantos físicas como morales. El hombre debe esquivar al toro, pero de cara, dejándose siempre ver lo más posible, situándose de manera deliberada en la línea de embestida natural del toro, asumiendo él mismo el riesgo de morir.»
Por sua vez, a edição de Setembro da revista britânica «Prospect» inclui um artigo do escritor Alexander Fiske-Harrison, intitulado «A Noble Death». A propósito de uma corrida a que assistiu em Sevilha, Fiske-Harrison rejeita o carácter «bárbaro» do toureio e enfatiza a lealdade do combate homem/touro (http://www.prospect-magazine.co.uk/article_details.php?id=10357).

«Eran las cinco en sombra de la tarde!»


Poucos meses antes de morrer, fuzilado pelos falangistas, o poeta Federico García Lorca afirmou numa entrevista: «Creo que los toros es la fiesta más culta que hay hoy en el mundo». Culta no sentido de estar fundamente enraizada na cultura ibérica, e nas culturas latino-americanas por ela geradas; e na acepção de fenómeno inspirador de «obras» que integram a cultura universal - no campo das artes plásticas, da literatura ou das artes cénicas. García Lorca deu, ele próprio, um contributo de monta para exaltação literária da Festa, com o seu majestoso «Llanto por la muerte de Ignacio Sánchez Mejías». Para além da poesia, o génio granadino filosofou também sobre o toureio, em escritos como «Teoría y juego del duende». A ligação de Lorca ao universo tauromáquico estendeu-se até ao momento da sua morte: o poeta foi fuzilado junto com dois bandarilheiros anarquistas, Joaquín Arcollas Cabezas e Francisco Galadí Melgar. (Composição gráfica de Francisco Moncada)