segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Farto de tanta «dinastia»...

Uma onda de pirismo, de pretensiosismo saloio e aristocratismo de pechisbeque está a varrer a Festa em Portugal. Refiro-me à moda das «dinastias». Durante algum tempo, só se falou em cavaleiros de «dinastia»: os Telles, o Lupi, os Moura. Agora, o fenómeno chegou aos forcados, com o anúncio de uma tourada em Évora, em que são anunciados forcados de «dinastia». Serão mais que os outros? Teremos qualquer dia a Festa reduzida a um espectáculo de castas, de clãs, de «dinastias»? Perante tanta vénia e pergaminho duvidoso, apetece contar uma «estória» de Mestre Baptista. Toureava certo dia o cavaleiro de S. Marcos do Campo com Manuel Conde e Zoio, que nos seus primeiros tempos se fazia anunciar nos cartazes como D. José João Zoio. Chegado à praça, Baptista juntou-se aos colegas no pátio dos cavaleiros e, com o seu sorriso mais plebeu, disparou: «Há lugar para mais um fidalgo?»

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A verdade natural


Ao género humano custa aperceber-se das evidências. Quase sempre, é o que está mais próximo de nós que se vê mal ou nem sequer se vislumbra. A propósito da corrida em Vila Franca que juntou os matadores Luis Miguel Encabo, Salvador Cortés e António João Ferreira, e em resposta às inanidades que alguém escreveu sobre o festejo, o blog tauromaquianaturales.blogspot põe o dedo na ferida. E recorda que para o toureio a pé a sorte de varas é indispensável. Lidar sem varas touros de 4 anos ou novilhos quase touros, é meio caminho para o desastre. E onde está o problema? Responde Emílio Franco: o problema está que em Portugal ninguém luta por recuperar a sorte de varas. E sem ela o toureio a pé está inquestionavelmente falseado. Esta a verdade natural, em boa hora recordada.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Link do dia

A Universidade Autónoma de Ciudad Juárez (México) disponibiliza no seu site uma magnífica colecção de bilhetes postais antigos, trezentos dos quais são de tema taurino. Os amadores da cartofilia ou os simples aficionados podem ver as grandes figuras do toureio retratadas em praças mexicanas, de Rodolfo Gaona a Chicuelo, de Belmonte a Manolete.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Bibliotaurus (1)


A biografia é um dos géneros desde sempre privilegiados pela literatura de tema tauromáquico. Raro é o toureiro de fama cujos trabalhos e dias não foram contados, com maior ou menor fortuna, em letra impressa. Uma das melhores obras do género é «Juan Belmonte, matador de toros», do jornalista sevilhano Manuel Chaves Nogales (1897-1944).
Como realça a também jornalista Josefina Carabias no interessante epílogo à obra, Chaves Nogales não era aficionado, nem mostrava o menor interesse pela vida taurina. Resolveu escrever sobre Belmonte levado apenas «por el interés que despierta siempre en el escritor un tipo humano de carácter excepcional.»
A história é contada na primeira pessoa, mas por detrás do monólogo belmontino está Chaves Nogales e a limpidez da sua linguagem. De acordo com Josefina Carabias, não há nela «exageraciones, ditirambos, tecnicismos ni latiguillos». Daqui resulta a legibilidade das suas páginas, que a torna acessível a todos. Não é preciso ser-se aficionado de solera, nem conhecer a fundo o argot taurino para saborear o trabalho de Chaves Nogales como quem saboreia uma excelsa faena.
Pelas páginas do livro, publicado em 1935, perpassa um Belmonte de coração aberto, que recorda o seu debute em Elvas, numa quadrilha de niños sevillanos, as inúmeras dificuldades para impor o seu original toureio, o convívio com os intelectuais seus partidários e por fim o triunfo – ensombrecido pela trágica morte de Joselito, o rival com quem viveu aquela a que chamaram a Idade de Ouro do toureio.
(«Juan Belmonte, matador de toros», Alianza Editorial, Madrid, 2003)

Palmas para quê?


O pesadelo começa aos primeiros acordes do pasodoble. O casal-que-foi-aos-toiros-porque-está-lá-o-social, a jovem turista japonesa, o provecto turista americano, alçam as mãozinhas e vá de bater palmas a compasso. Pavlov teria aqui muito que estudar. É assim nos circos, quando toda a companhia desfila ao som da orquestra, ou quando os palhaços pedem às crianças que batam palminhas. O fenómeno tem nome: infantilização, mau gosto, ignorância. Por mim, se fosse cavalo ou toiro, enchia a arena de cheirosa matéria orgânica, como forma de protesto. Se fosse empresário, faria o inverso do que se faz em concursos e talk-shows televisivos. Em vez de pôr um sujeito a mandar o público bater palmas, poria um com um cartaz que rezaria: não bater palminhas enquanto a música toca. Tenho esperança que um dia destes um toureiro levante a mão e peça ao maestro para calar a fanfarra, e com ela o enervante palmejar. Como fazem os matadores-que-matam-mesmo, quando pedem à banda que suspenda a música no momento da estocada. Mas estamos em Portugal. Aqui não se afere o êxito dos artistas pelas orelhas que cortam, mas pelas voltas ao redondel ou pela musiquinha que soa ou não soa. Quem manda é o Paquito Chocolatero... Ou o Nerva, que sempre é menos kitsch.