
No final duma lide muito aplaudida, António Luiz Lopes pega no rojão de morte, dando mostras de querer estoquear o toiro. Porém, Ferreira do Amaral opõe-se, e o cavaleiro de Alhandra, acatando a decisão da autoridade, volta atrás. O público é que não concorda. «O caso levantou protestos por parte do público», nota o repórter d'«O Século». «Alguns conflitos pessoais se deram entre um reduzido número de espectadores e aos quais a Polícia, sem consequências de maior, pôs termo».
O espectáculo prossegue normalmente, até à lide do sétimo toiro, que coube a Fausto Barajas. Num gesto libertador, o madrileno pede autorização a Ferreira do Amaral para usar o estoque de verdade. Desta vez, o governador civil cede e Barajas faz rodar o coimbra com meia estocada e dois descabellos. Armillita faz o mesmo, deitando o seu toiro por terra com uma estocada inteira.
O clamor foi unânime. «Não se pode descrever o entusiasmo dos aficionados e a ovação que foi feita aos dois artistas: palmas, lenços agitados, etc. O público saltou à arena, pegou em triunfo nos 'espadas' dando volta aquela, no meio da maior ovação que temos presenciado em touradas, e assim foram os 'diestros' conduzidos até fora da praça», escreve Máximo Alcobia, n'«O Século».
Como explicar o sucedido? Por que morreram estes coimbras na arena, como os toiros bravos, e não no vil matadouro? Um conjunto de circunstâncias terá contribuído para tal. Estávamos em 1927. No ano anterior, a revolução de 28 de Maio tinha derrubado a I República e iniciado um novo ciclo político. Os tempos pareciam propícios a mudanças e, entre elas, por que não os toiros de morte? Havia depois a autoridade que o presidente dessa corrida histórica detinha. Respeitado pelos seus feitos militares em África e na Flandres, e sobretudo pelo combate à violência política nos derradeiros anos da I República, Ferreira do Amaral podia permitir-se o gesto de consentir um espectáculo que, de resto, a lei não proibia expressamente. O Decreto 5650 punia a violência exercida sobre animais, a Portaria 2700, de 6 de Abril de 1921, veio esclarecer que ele compreendia implicitamente os toiros de morte, mas, preto no branco, nenhum diploma os interditava. Por fim, não é demais referir que o toureio a pé gozava nesse tempo de grande popularidade em Portugal. Ao Campo Pequeno acorriam os grandes diestros do país vizinho, desde os Bienvenida a Marcial Lalanda, passando por Chicuelo e Niño de la Palma, até mexicanos como Pepe Ortíz e Armillita. Esta conjugação de factores abriu caminho ao mais sério debate sobre a reimplantação dos toiros de morte em Portugal, que se prolongou, como veremos, até 1933.
Nenhum comentário:
Postar um comentário