quinta-feira, 26 de março de 2009

Ataque à Marinha

A realização de uma corrida de touros na Marinha Grande desencadeou nova ofensiva dos alegados defensores dos animais. Na Câmara, começaram a chover os e-mails do costume, alertando os imprevidentes autarcas para os «perigos» do espectáculo.
A estratégia do fascismo animalista é clara. A pressão sobre as autoridades começou por terras onde a Festa não se encontra firmemente implantada, pois os seus responsáveis, em princípio, são mais fáceis de manipular. Depois da proibição das corridas programadas, quererão que essas localidades se declarem «anti-touradas» Obtido um ramalhete de terras «anti-taurinas» considerado satisfatório, terão mais força para avançar para outras zonas e influenciar, inclusivamente, o poder central.
Que ninguém se iluda. A ofensiva não vai parar e só se combate eficazmente com a oposição determinada dos agentes taurinos. Inexplicavelmente, porém, estes limitam-se ao protesto de circunstância. Mais do que nunca, é preciso recordar aos diversos poderes (aos mais distraídos, lembramos que existe uma Associação Nacional de Municípios, que até tem uma secção de municípios com actividade taurina) que o espectáculo taurino é legal e que os aficionados não são criminosos. É o momento de empresários, Sindicato dos Toureiros, associações de forcados, ganadeiros, etc., provarem que o seu propalado amor à Festa ultrapassa os meros interesses pessoais. Ou será que só se vão mexer quando o problema lhes chegar aos bolsos?

quarta-feira, 25 de março de 2009

A única foto da praça do Campo de Santana?

Se não for a única, deve ser das escassas imagens fotográficas da praça de touros do Campo de Santana, que existiu em Lisboa entre 1831 e 1891. A raridade encontra-se no Arquivo Fotográfico da CML e foi «emprestada» pelo blog Bic Laranja. Cite-se o blogger: «Trata-se duma panorâmica tomada do Largo da Nossa Senhora do Monte sobre o Desterro; arrisco dá-la ao 3º quartel do séc. XIX. A praça do Campo de Santana é aquele corpo negro no quadrante superior esquerdo; para a sua direita estende-se o casario ocidental do Campo de Santana (ou Campo dos Mártires da Pátria); ao fundo avisto nitidamente o Monsanto. Em baixo, à direita, o Hospital do Desterro.»

segunda-feira, 23 de março de 2009

«História do Olho» ou a tragédia de Granero em livro

Manuel Granero foi uma das grandes esperanças do toureio dos anos 20. Pelas suas qualidades, o diestro valenciano era visto como o mais sério candidato ao trono deixado vago por Joselito, após a sua trágica morte em Talavera de la Reina. Com Chicuelo, Marcial Lalanda e outros, Granero traçava a nova linha do toureio, iniciada por Belmonte e confirmada por Joselito. Mas a fatalidade não lhe permitiu voar alto. A 7 de Maio de 1922, em Madrid, Granero é ferido mortalmente pelo touro Pocapena, do duque de Veragua. A colhida foi impressionante: o corno de Pocapena penetrou no olho direito do toureiro, matando-o em poucos minutos.
Entre os espectadores que assistiram à morte de Granero encontrava-se o escritor francês Georges Bataille (1897-1962). O dramático sucesso está presente no seu livro «História do Olho», uma obra de um erotismo violento, onde amor e morte, céu e inferno se cruzam e contaminam, colocando o autor ao lado dos grandes escritores libertinos, como Sade ou Masoch. «Campos de análise» de Bataille são, entre outros, «a cosmogonia do desespero, a alucinação acesa e amarga da solidão absoluta», escreve José Carlos González, que em 1988 traduziu a obra para a editora Livros do Brasil. «A 7 de Maio de 1922, La Rosa, Lalanda e Granero deviam tourear na praça de Madrid. Com Belmonte no México, Lalanda e Granero eram os grandes matadores espanhóis»...

sexta-feira, 20 de março de 2009

Dois maestros

Manuel Rodríguez Manolete e Simão da Veiga, no pátio de quadrilhas de uma praça de touros presumivelmente em Espanha. Simão da Veiga (1903-1959) toureou bastante no país vizinho, competindo, por exemplo, com o rejoneador Antonio Cañero. Nas principais praças espanholas – Madrid, Sevilha, Barcelona, Pamplona – Simão lidou e estoqueou touros em pontas. Actuou em Manzanares, em 11 de Agosto de 1934, na corrida em que o célebre matador Ignacio Sánchez Mejías foi mortalmente colhido pelo touro Granadino. Do currículo de Simãozinho, como era conhecido, consta a glória de ter sido o primeiro português a cortar uma orelha em Madrid. Na mesma imagem, dois toureiros de génio: o Monstruo de Córdova e o cavaleiro do Lavre.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Viu estas peças? (III)

Trajes de luces numa vitrina. Talvez um deles fosse o último que Manolo Bienvenida envergou, e que seu pai, o Papa Negro, ofereceu ao museu do Campo Pequeno. Quem o viu?

Viu estas peças? (II)

Quadros, vitrinas contendo casacas de cavaleiro, capotes de passeio e objectos diversos, cabeças de touros embalsamadas... Onde páram?

Viu estas peças? (I)

Pertencem ao Museu João Baptista Duarte, inaugurado em 1937, numa dependência da praça de touros do Campo Pequeno. Há alguns anos, as centenas de peças que compunham o acervo do museu desapareceram misteriosamente (?), levando consigo uma importantíssima parte da memória daquela praça e da própria tauromaquia portuguesa. O caso deve ser único no mundo. Não desapareceu um, nem dois objectos: foi todo o recheio do museu que levou sumiço. É certo que o touro cuja cabeça aqui se reproduz se chamava Vadiante, mas não terá sido por isso que o animal deixou o museu e anda por aí a vadiar...
As imagens são da autoria do fotógrafo Mário Novais e foram publicadas no nº 25/26 da revista «Panorama», em 1945.


quarta-feira, 18 de março de 2009

25 anos de alternativa de António Telles em livro

Os 25 anos de alternativa de António Ribeiro Telles, que se assinalaram a 21 de Julho do ano passado, são o motivo do lançamento de uma fotobiografia do cavaleiro de Coruche. São seus autores João Carrinho e o próprio fotobiografado. Segundo a nota de apresentação, a obra «retrata a carreira repleta de sucessos de António Ribeiro Telles, abordando a sua vida profissional, a relação com a família, a Herdade da Torrinha, os ensinamentos de seu Pai, os cavalos, o campo e o conceito clássico do seu toureio.»
Se há cavaleiro cuja carreira merecia um trabalho semelhante, é António Ribeiro Telles. Pelos seus méritos, mas também por ser o mais fiel representante de um conceito de lide ameaçado: o toureio a cavalo à portuguesa. Num momento em que as nossas praças assistem a patéticas manifestações de luso-rejoneio, António Telles toureia raivosamente à portuguesa, prosseguindo e honrando a mensagem paterna. Até no simples gesto de actuar de tricórnio -estampa toureira!-se vê o muito que o distingue dos demais. Com os 25 anos de alternativa de António Telles é o próprio toureio português que está de parabéns.

terça-feira, 17 de março de 2009

Juanita Cruz, primeira mulher matadora de touros


Há precisamente 69 anos, doutorava-se na praça mexicana de Fresnillo Juanita Cruz- a primeira mulher a obter a alternativa de matador de touros. Nascida em Madrid, em 1917, começou a tourear em 1932, mas a guerra civil travou-lhe o passo. Radicou-se então na América Latina, onde colheu significativos triunfos. Na posse da alternativa, regressou a Espanha em 1946, para exercer a profissão no seu país. Contudo, uma lei impedia as mulheres de tourearem em solo espanhol, o que truncou irremediavelmente a carreira de Juanita. Ainda como bezerrista, actuou no Campo Pequeno em 11 de Junho de 1933, num festival de variedades taurinas. «A elegante toureira espanhola não teve medo dos garraios e mostrou habilidade nos passes de capote», garantia «O Século».

Rogério e Mário


À esquerda, Rogério Perez, El Terrible Perez, jornalista e crítico taurino; à direita Mário de Sá-Carneiro, poeta; ao centro, Gilberto Rola. A foto, publicada no nº 117/118 da revista «Colóquio/Letras» (Setembro de 1990), data dos primeiros anos do século passado (Sá-Carneiro nasceu em 1890 e suicidou-se em 1916), e mostra que os interesses e as amizades de El Terrible Perez excediam o mundo taurino. No nº 7 da «Contemporânea», revista de artes e letras notável pelo seu grafismo, encontramos um seu «Discurso» num banquete da revista, em que evoca, de passagem, a sua amizade com Sá-Carneiro. Mas Rogério Perez (1890-1979) distinguiu-se sobretudo como crítico de touros, nas colunas do «Diário de Lisboa». E logo aquele «que mais viveu as entranhas do mundo taurino, e mais conhecido se tornou das figuras grandes do seu tempo» (Solilóquio, «Memórias de um bilhete de sol»). Essas figuras foram muitas, desde os Gallos, Rafael e José, a Juan Belmonte, de Gitanillo de Triana a Pepe Luis Vazquez e deste a Manolete. Foi representante em Portugal do rejoneador Antonio Cañero e organizou, em 1933, corridas com touros de morte, no Campo Pequeno. Destacou-se também pelas reportagens que fez em Espanha, antes e durante a guerra civil, ao serviço do «Diário de Lisboa». Rogério Perez reuniu as suas memórias no livro «Meio século a ver touros» (Ed. Marítimo-Colonial, 1945).

domingo, 15 de março de 2009

Touros no Terreiro do Paço, em 1661


Nos tempos da monarquia, não havia entronização, casamento ou baptizado real que não contasse com festas de touros. No século XVII e até mais tarde, à falta de praças de touros, os espectáculos eram celebrados em praças públicas. Existe na Biblioteca Nacional uma curiosa descrição, em verso, das «Festas Reays na Corte de Lisboa», por ocasião do «feliz cazamento dos Reys da Grão Bretanha Carlos, & Catherina». Tratava-se da princesa Catarina de Bragança, filha de D. João IV e de D. Luísa de Gusmão, que em 1662 casou com Carlos II de Inglaterra. Comemorando antecipadamente o evento, correram-se touros no Terreiro do Paço, em Outubro de 1661. Os autores do poético relato (http://purl.pt/12167/4/l-1277-1-a_PDF/l-1277-1-a_PDF_01-B-R0300/l-1277-1-a_0000_rosto-28_t01-B-R0300.pdf) são Izandro, Aonio e Luzindo, «toureiros de forcado». (Ilustração de Roque Gameiro)

sexta-feira, 13 de março de 2009

«The national champion bull-stabber» ou a força do mito Belmonte


Ei-lo. De chapéu de coco, gravata e sobretudo, na capa da revista americana «Time», de 5 de Janeiro de 1925. Juan Belmonte, o toreador, the national champion bull-stabber, o campeão nacional dos matadores de touros. Belmonte estava de passagem por Nova Iorque, a caminho do Perú. Em Manhattan, nota a «Time», aquele a quem chamaram o Pasmo de Triana passou despercebido; no Perú, pelo contrário, a sua chegada foi motivo de feriado nacional.
No artigo que dedica ao toureiro, a «Time» mostra porque já nessa altura era uma das melhores publicações do mundo. Num estilo escorreito, o jornalista traça o retrato de Belmonte, destacando a sua rivalidade com Gallito, e descreve aos leitores o essencial sobre a profissão de toureiro e a actividade tauromáquica - o «desporto nacional» espanhol. Um dos seus poucos deslizes(?) é o de chamar capeman ou capaderos aos peões de brega. A atenção da «Time» prova a força mítica de Juan Belmonte e a enorme popularidade de que já em 1925 gozava. Acarinhado por intelectuais e artistas, idolatrado por uma imensa falange de aficionados, a fama do trianero tinha chegado à América.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Um califa no Rossio

Rafael Guerra Guerrita (1862-1941) foi um dos maiores e mais famosos toureiros do século XIX. Com Lagartijo e Frascuelo, El Guerra é um dos pilares da tauromaquia da segunda metade de Oitocentos. Por ter sido um dos cinco grandes diestros nascidos em Córdoba, é considerado um dos cinco califas taurinos da cidade andaluza. Guerrita actuou inúmeras vezes em Lisboa, onde era idolatrado pela afición. A fotografia que se reproduz, datada de 16 de Maio de 1895, mostra o califa cordovês a cruzar o Largo D. João da Câmara, ao Rossio, num trem, a caminho do Campo Pequeno.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Sobre a naturalidade

«Cuadernos de Tauromaquia», uma das mais interessantes revistas taurinas do momento, vai no seu terceiro número. Ao mérito dos temas e à profundidade com que são abordados, soma-se um factor não neglicenciável para nós, portugueses: encontra-se facilmente à venda, quer em Lisboa quer no interior (sul, pelo menos) do país. Um dos atractivos deste nº 3 da revista é a rubrica Taurologías, na qual, a propósito do conceito de naturalidade no toureio e da personalidade do diestro sevilhano Pepe Luis Vázquez, se tecem pertinentes considerações.
Para Ángel Cervantes, o autor do texto, como certamente para muitos outros aficionados, a quietude é um dos conceitos mais valorizados no toureio dos nossos dias. Uma mão cheia de matadores importantes, como José Tomás, Miguel Ángel Perera, Alejandro Talavante, Sebastián Castella e outros, fazem da quietude o condimento essencial das suas lides. Imóveis, indiferentes ao furor do adversário, ligam passes num palmo de terreno. Tanta firmeza desperta a emoção do público e, naturalmente, o aplauso. Mas, questiona Ángel Cervantes, o que é feito da naturalidade? Porque além de cultivar o imobilismo, um toureiro deve também saber andar na cara do touro. Com elegância e sentido estético. Com arte.
E o que é a naturalidade para Ángel Cervantes? É a falta de artifício; a falta de afectação; a falta de cerimónia. Tudo qualidades que Pepe Luis, a quem chamaram o Sócrates de San Bernardo, possuía como poucos. Onde páram, hoje, estes conceitos? (Apunte de Venancio González Garcia)

segunda-feira, 9 de março de 2009

Passo a citar (III)

«Se nasces em Portugal e queres ser matador de toiros, tens de te ir embora. Aqui não. Tens de te sacrificar e dar o salto. É preciso ter uma paixão muito grande e estar completamente enamorado desta profissão»

Júlio Gomes (Novo Burladero, Março de 2009)

domingo, 8 de março de 2009

À atenção do doutor presidente Defensor Moura

Caro doutor presidente Defensor
Não calcula como a minha alma zoófila rejubilou ao saber da sua decisão de comprar a praça de touros de Viana do Castelo, para nesse decrépito antro de tortura instalar um centro de ciência viva. Que sábia medida! A ciência, caro doutor presidente, precisa de praças de touros como do pão para a boca. Se outros lhe seguirem as pisadas, havemos de ver como a ciência progride em Portugal!
Ainda não tinha digerido o contentamento, quando outro raio de felicidade me atingiu: a declaração de Viana como cidade anti-touradas. Que prestígio para a terra que o elegeu! E como os touros o vão recompensar! Já estou a vê-lo, doutor presidente, no meio duma manada, recebendo as córneas carícias dos boizinhos agradecidos.
Mas não é apenas por isso que lhe escrevo. Imagine, doutor presidente, que há uns dias fui em passeio ao Alentejo, eu e as minhas companheiras da associação Amigos da Bicheza. Fomos para os lados da barragem de Alqueva e passámos por uma aldeia chamada Amieira, não sei se conhece. Pois bem: não contente em ter uma praça de touros logo à entrada, a dita aldeia tem também uma enorme estátua representando uma pega de caras! Que descaramento! Mas o pior (prepare-se, doutor presidente), ainda não é isto. O pior é que a freguesia da Amieira tem como brasão um par de instrumentos de tortura, bandarilhas ou lá como lhes chamam. Pode conceber-se maior desaforo? Bem sei que fomos bem recebidas na aldeia, que as ruas são limpas e a gente é atenciosa. Mas isso deve ser para disfarçar, porque quando entram na praça de touros, devem transformar-se em vampiros sedentos de sangue. Doutor presidente Defensor: venha já à Amieira e compre não apenas a praça, mas a aldeia toda. Faça dela um centro de ciência, para o estudo da minhoca, do caracol ou doutro animalzinho qualquer. A bem da ciência! A bem da bicheza! Receba a admiração desta que se assina
Maria Estorninho Salamandra